sábado, 16 de maio de 2009

A FÉ É POP...

Nelson Motta




Não sei se o fenômeno é de origem cultural, mercadológica ou religiosa, mas os números das gravadoras no ano passado não mentem. Os maiores vendedores de discos no Brasil são os padres Marcelo Rossi e Fábio de Melo. Entre as cantoras, a evangélica Aline Barros só perde para a profana Ivete Sangalo.



Seria o sucesso desses artistas uma prova de que o Senhor deles, mesmo sendo Senhores diferentes, os protegem e favorecem? Há controvérsias, já que uma infinidade de cantores de todos os credos lança seus discos, mas poucos são os escolhidos pelos deuses do sucesso. Talvez porque lhes falte uma boa produção, distribuição ou marketing. Ou uma pinta de galã, como o padre Fábio, nova sensação dos palcos e púlpitos. Ou uma música melhorzinha.



O gospel, raiz e fonte de todos os grandes gêneros musicais americanos, do jazz ao rock, do R&B ao soul, do funk ao rap, é um mercado milionário, competitivo e sempre renovado. Grandes estrelas, como Roberta Flack e Aretha Franklin, vieram dele. No mundo da black music se diz, brincando, que não há diferença entre o gospel e o soul romântico: basta você trocar nas letras o “He”, do Senhor, pelo “She”, do grande amor: música e letra continuam encaixando.



Cantores religiosos já fizeram muito sucesso nos Estados Unidos, como Al Green, nos anos 70; no mundo latino, como o padre mexicano José Mojica, nos 50; na Europa, como a freirinha Dominique, nos anos 60, mas nunca neste planeta eles venderam tanto como agora no Brasil. Apoiados por marketing agressivo de grandes gravadoras e com um público de, literalmente, fiéis, não há Ivete Sangalo, Roberto Carlos ou Zeca Pagodinho que venda mais discos do que os padres cantores.




Fora de qualquer consideração artística, uma hipótese razoável é que a pirataria, grande praga do disco, afetaria muito menos a música religiosa do que a profana, porque o seu público é de devotos, que cumpre as regras da sua igreja. E comprar disco pirata é condenado em qualquer religião - porque rouba os artistas e não paga imposto nem dízimo. É, pode ser.


Para a combalida indústria do disco, não há duvidas: é milagre.




O Estado de São Paulo- (15/05/09)

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