sábado, 17 de julho de 2010

MULHER BUNDA MOLE...

Belinha acordou às seis, arrumou as crianças, levou-as para o colégio e voltou para casa a tempo de dar um beijo burocrático em Artur, o marido, e de trocarem cheques, afazeres e reclamações. Fez um supermercado rápido, brigou com a empregada que manchou seu vestido de seda, saiu como sempre apressada, levou uma multa por estar dirigindo com o celular no ouvido e por estacionar em lugar proibido, enquanto ia, por um minuto, ao caixa automático tirar dinheiro.


No caminho do trabalho , pensava quando teria tempo de fazer a unha e pintar o cabelo antes que se transformasse numa mulher grisalha. Chegando ao escritório, foi quase atropelada por uma gata escultural que, segundo soube, era a nova contratada da empresa para o cargo que ela fez de tudo para pegar, mas que, apesar do currículo excelente e de seus anos de experiência e dedicação, não conseguiu. Pensou se abdomem definido contaria ponto, mas logo esqueceu a gata, porque no meio de uma reunião ligaram do colégio de Clarinha, sua filha mais nova, dizendo que ela estava com dor de ouvido e febre.


Tentou em vão achar o marido e, como não conseguiu, resolveu ela mesma ir até o colégio. Saiu esbaforida e encontrou seu carro com pneu furado. Pensou em tudo que ainda ia ter que fazer antes de fechar os olhos e sonhar com um mundo melhor. Abandonou a droga do carro avariado, pegou um táxi e as crianças. Quando chegou em casa, descobriu que tinha deixado a pasta com o relatório que precisava ler para o dia seguinte no escritório!


Telefonou para o celular do marido com a esperança que ele pudesse pegar os malditos papéis na empresa, mas continuava fora de área. Tomou banho, deu o jantar para as crianças, fez os deveres com eles e botou para dormir. Artur chegou puto de uma reunião em São Paulo, reclamando de tudo. Jantaram em silêncio.


Na cama ela leu metade do relatório e começou a cabecear de sono. Artur a acordou com tesão, a fim de jogo. Como aqueles momentos estavam cada vez mais raros no casamento deles, ela resolveu fazer um último esforço de reportagem e transar. Deram uma meio rápida, meio mais ou menos, e, quando estava quase pegando no sono de novo, sentiu uma apalpadinha no seu traseiro com o seguinte comentário:
- Tá ficando com a bundinha mole, Belinha... deixa de preguiça e começa a se cuidar..


Belinha olhou para o abajur de metal e se imaginou martelando a cabeça de Artur até ver seus miolos espalhados pelo travesseiro! Em seguida usou a técnica que aprendeu num livro de auto-ajuda: como controlar as emoções negativas. Respirou três vezes profundamente, mentalizando a cor azul, e ponderou. Não ia valer a pena, não estamos nos EUA, não conseguiria uma advogada feminista caríssima que fizesse sua defesa alegando que assassinou o marido cega de tensão pré-menstrual...Resolveu agir com sabedoria.


No dia seguinte, não levou as crianças ao colégio, não fez um supermercado rápido, nem brigou com a empregada. Foi para uma academia e malhou duas horas. De lá foi para o cabeleireiro pintar os cabelos de acaju e as unhas de vermelho. Enquanto se hospedava num spa, ouviu o marido desesperado tentar localiza-lá pelo celular e descobrir por que ela havia sumido. Pacientemente não atendeu. E, como vingança é um prato que se come frio, mandou um recado lacônico para a caixa postal dele.

- A bunda ainda está mole. Só volto quando estiver dura. Um beijo da preguiçosa...


Do livro "Este sexo é feminino", de Patrícia Travassos



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